Jorge,
Certa vez, quando questionei sobre uma frase de um artigo seu, publicado em Luz na Mente, e mantivemos um vai-e-vem de argumentos espíritas, você me disse que gostava desse tipo de debate. Portanto, perdoe-me a insistência, mas você já me conhece o suficiente para saber que sou assim mesmo, enquanto tenho dúvidas.
Em O Livro dos Espíritos, temos:
155 – Como se opera a separação da alma e do corpo?
- Rompidos os laços que a retinham, ela se liberta.
A separação se opera instantaneamente e por uma transição brusca? Há uma linha de demarcação bem nítida entre a vida e a morte?
- Não, a alma se liberta gradualmente e não se escapa como um pássaro cativo que ganha subitamente a liberdade. Esses dois estados se tocam e se confundem; assim, o Espírito se liberta pouco a pouco de seus laços: os laços se desatam, não se quebram.
Mais adiante temos:
A observação prova que, no instante da morte, o desligamento do perispírito não se completa subitamente; ele não opera senão, gradualmente, e com uma lentidão que varia muito segundo os indivíduos. Para alguns ele é muito rápido, e pode-se dizer que o momento da morte é aquele do desligamento, algumas horas após. Para outros, aqueles sobretudo, cuja vida foi toda material e sensual, o desligamento é muito menos rápido e dura, algumas vezes, dias, semanas e mesmo meses, o que não implica existir, no corpo, a menor vitalidade nem a possibilidade de um retorno à vida, mas uma simples afinidade entre o corpo e o Espírito, afinidade que está sempre em razão da preponderância que, durante a vida, o Espírito deu à matéria. Com efeito, é racional conceber que quanto mais o Espírito se identifica com a matéria, mais ele sofre ao se separar dela. Ao passo que a atividade intelectual e moral, a elevação dos pensamentos, operam um começo de libertação mesmo durante a vida do corpo e, quando chega a morte, ela é quase instantânea. Tal é o resultado dos estudos feitos sobre todos os indivíduos observados no momento da morte.
Daí, eu pergunto:
R: NÃO. Eis que Joana de Angelis e Chico já se manifestaram, favoravelmente, a respeito desse assunto.
R: Ninguém pode responder, pois a doação de órgãos não era cogitada à época de Kardec.
Como sabemos, ao invés de se prolongar artificialmente o processo de morte (distanásia), deixa-se que este processo se desenvolva naturalmente (ortotanásia), situação do paciente que já se encontra em morte cerebral ou encefálica. Neste caso, a pessoa já está morta, permitindo a lei, inclusive, não apenas que os aparelhos sejam desligados, mas que seus órgãos sejam retirados para fins de transplantes.
No seu artigo você diz: os aparelhos podem manter a vida vegetativa, por vezes, por tempo indeterminado. Logo, nem sempre por tempo indeterminado.
Então, eu pergunto:
Por hoje é só. Já o apoquentei demais.
Se puder e convier, analise comigo essas colocações.
Um grande abraço
Jonas
A separação se opera instantaneamente e por uma transição brusca? Há uma linha de demarcação bem nítida entre a vida e a morte?
- Não, a alma se liberta gradualmente e não se escapa como um pássaro cativo que ganha subitamente a liberdade. Esses dois estados se tocam e se confundem; assim, o Espírito se liberta pouco a pouco de seus laços: os laços se desatam, não se quebram.
Mais adiante temos:
A observação prova que, no instante da morte, o desligamento do perispírito não se completa subitamente; ele não opera senão, gradualmente, e com uma lentidão que varia muito segundo os indivíduos. Para alguns ele é muito rápido, e pode-se dizer que o momento da morte é aquele do desligamento, algumas horas após. Para outros, aqueles sobretudo, cuja vida foi toda material e sensual, o desligamento é muito menos rápido e dura, algumas vezes, dias, semanas e mesmo meses, o que não implica existir, no corpo, a menor vitalidade nem a possibilidade de um retorno à vida, mas uma simples afinidade entre o corpo e o Espírito, afinidade que está sempre em razão da preponderância que, durante a vida, o Espírito deu à matéria. Com efeito, é racional conceber que quanto mais o Espírito se identifica com a matéria, mais ele sofre ao se separar dela. Ao passo que a atividade intelectual e moral, a elevação dos pensamentos, operam um começo de libertação mesmo durante a vida do corpo e, quando chega a morte, ela é quase instantânea. Tal é o resultado dos estudos feitos sobre todos os indivíduos observados no momento da morte.
Daí, eu pergunto:
- O Espiritismo é contra a doação de órgãos?
R: NÃO. Eis que Joana de Angelis e Chico já se manifestaram, favoravelmente, a respeito desse assunto.
- O Espiritismo é contra desligar os aparelhos que mantêm a vida vegetativa?
R: Ninguém pode responder, pois a doação de órgãos não era cogitada à época de Kardec.
Como sabemos, ao invés de se prolongar artificialmente o processo de morte (distanásia), deixa-se que este processo se desenvolva naturalmente (ortotanásia), situação do paciente que já se encontra em morte cerebral ou encefálica. Neste caso, a pessoa já está morta, permitindo a lei, inclusive, não apenas que os aparelhos sejam desligados, mas que seus órgãos sejam retirados para fins de transplantes.
No seu artigo você diz: os aparelhos podem manter a vida vegetativa, por vezes, por tempo indeterminado. Logo, nem sempre por tempo indeterminado.
Então, eu pergunto:
- Espiritualmente analisando, será correto desligar os aparelhos?
- Será que os que ficam muito mais tempo presos aos aparelhos são aqueles em que o Espírito não quer se desligar da matéria?
- Será que esse tempo, em que estão presos à matéria, não é fundamental para que se conscientizem, muito gradualmente, da necessidade do desligamento?
- Será que esse tempo não é fundamental para que, após o enterro, não sofram mais, ainda, ao experimentar o horror da decomposição?
Por hoje é só. Já o apoquentei demais.
Se puder e convier, analise comigo essas colocações.
Um grande abraço
Jonas
Jonas,
Sintetizando as suas quatros questões a mim enviadas respondo-lhe conforme a seguir:
O tema nos remete ao problema da ortotanásia. Como você explicou muito bem há sutil diferença entre a distanásia e a ortanásia, porém, diante de uma ou outra situação haverá consequências espiritual de conformidade com a visão espírita? Ainda corroborando com suas assertivas, Jonas, e consoante define o "Aurélio", de fato a distanásia é a “morte lenta”, ansiosa e com muito sofrimento, enquanto ortanásia (contrário da eutanásia) consiste em atrasar a chegada da morte, por todos os meios possíveis. Alguns especialistas denominam-na ortotanásia e elucidam que são quase a mesma coisa, a distanásia e a ortanásia. Em verdade creio que quando se pretende prolongar a vida com o objetivo de impedir a morte a todo custo ante qualquer quadro patológico, para mim muitas vezes se impõe a muitos pacientes sofrimentos desnecessários, que acabam por se prolongar após a desencarnação.
Outra coisa importante de se ressalter é o Código de Ética Médico permite que os profissionais não adotem ações terapêuticas inúteis a pacientes terminais sem chance de cura – ou seja, libera a ortotanásia. Isso equivale afirmar a aplicação de cuidados da medicina paliativa, que tem por objetivo eliminar a dor e garantir conforto ao paciente terminal ou com doença potencialmente fatal. Para esse mister o Código coloca como obrigatório o uso de meios terapêuticos ordinários e proporcionais com os pacientes.
Talvez não seja muito claro o que são meios ordinários ou extraordinários do código, o que pode abrir brecha para a confusão com a eutanásia, mas não se está tratando da eutanásia, com certeza. A rigor os alimentos e a hidratação, mesmo que por sonda, são ordinários e devem ser mantidos, obviamente.
O detalhe do Código Médico é que estão excluídos da abrangência da legal pacientes mantidos por anos ligados a aparelhos – como aquele rumoroso caso da italiana Eluana Englaro, morta ano passado após 17 anos em estado vegetativo, depois de retirados os tubos que a alimentavam.
Jonas, outra coisa importante para nossa convicção é que o código ajuda a clarear essa confusão em torno do sufixo (tanásia vem do grego thanatos, que significa morte), que confunde ortotanásia com eutanásia.
A ortotanásia é perfeitamente aceita pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)e pelos líderes de várias outras denominações religiosas. O que me levou a consultar uma entrevista cedida por Divaldo Franco aos jornalistas do DF, por ocasião da homenagem a Allan Kardec, realizado em Brasília nos dias 16 e 17 de abril de 2005, organizado pela Federação Espírita do Distrito Federal (FEDF), com apoio da Federação Espírita Brasileira (FEB) oportunidade que o tribuno respondeu a perguntas sobre temas como aborto, eutanásia, auto-estima e bem-estar físico e espiritual. Sobre a eutanásia, Divaldo ressaltou: “A pessoa que pratica eutanásia é suicida e volta em outra existência para repor aquele período que roubou da própria vida. Então, se a pessoa pede para a sua vida ser interrompida, não completa o seu período, o seu desenvolvimento. Mas a ortotanásia é legítima. É quando a pessoa que já não responde a qualquer terapêutica, opta por não se submeter a novos tratamentos mais dolorosos, mas continua com medicamentos e tratamentos médicos. Estes indivíduos aguardam a morte natural. Foi o que ocorreu com o Papa João Paulo II, que pediu para ficar em casa e aguardar a morte lúcido, trabalhando, servindo. O que é perfeitamente digno”.
Não sei se consegui explicar-lhe , mas posso assegurar-lhe que o Espiritismo não é desfavorável a ortotanásia.
Um abraço.
Jorge Hessen